segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Viagens na "minha" terra


 

Já tinha saudades de andar de comboio. Decididamente gosto de velocidade, aviões, comboios, até carros, venham eles.
Adoro Portugal. Estamos mal. Sou mais da opinião que podíamos estar bem pior mas isso dava outra conversa.
Junto à janela olho a paisagem salpicada pelas gotas de chuva. Como se de propósito toca a música “Please don’t stop the rain”. Please don’t, pelo menos até chegar ao destino. A paisagem pintalgada do mar, das dunas, dos rios, das pontes, do céu cinzento é bastante agradável.
Aveiro. Os chuviscos dão lugar ao sol. O senhor do lugar de trás, sem pedir licença, baixa o estore e o meu campo de visão diminui substancialmente. A minha liberdade termina onde começa a dos outros. Ao menos teve o discernimento de não o baixar totalmente. Não sei se aguento duas horas assim limitada.
Não me apetece acabar o livro que ando há muito a saborear, “I gess I’ll try again tomorrow”.
Baixo-me na cadeira para conseguir vislumbrar o verde dos pinheiros em contraste com a cor do céu.
O cheiro dos almoços embrulha-me ainda mais o estômago que desde ontem anda às voltas.
Tenho que aumentar o volume ao rádio. O granizo a bater no metal é ensurdecedor.
Passou e o sol já espreita outra vez, mas pouco.
Não acredito, o homem de trás baixou o estore até ao fundo. Deve estar a gozar comigo. Respiro fundo! Se calhar adormeceu encima dos botões porque não pára de subir e baixar de quando em quando. Já tem idade para se deixar de brincadeiras, deve ter algo mais grave do que um “problema de expressão”.
Uma hora de viagem. Coimbra e o parvo de trás sai. Subo o estore até ao cimo.
Entram para a minha frente uns senhores engravatados. Uma das gravatas é verde alface, ainda se usa? São super profissionais. Sacam do portátil e no meio do ar sério com uns sorrisos marotos à mistura começam a teclar desenfreadamente principalmente porque a net não funciona como devia. É dos carecas que elas gostam mais? Não generalizando este até é giro. Não sei o que quererá dizer mas a música que começa “all of my life where have you been”. O meu amigo ainda não disse nada sobre logo à noite… “She lives in  a fairy tale”.
O cheiro ao estufado continua insuportável. A vista pela janela distrai-me. No meio das casinhas brancas acaba sempre por se destacar uma amarela, ou de azulejos. Estas últimas fazem-me lembrar casas-de-banho.
Os pássaros preferem voar a estar nos ramos avermelhados oscilantes. Alguns arriscam alienar as vacas castanhas que parecem não se importar com a sua presença.
“Can you feel my heart is beating”. A chegada ao destino aproxima-se e o coração começa, tal como o comboio, a acelerar, o estômago continua zangado, as pernas a ficar irrequietas. Respiro fundo porque não há razão para tal. Fecho os olhos e deixo que “drops of Jupiter” me serenem.

2 comentários:

  1. Se de cada vez que fizesses uma viagem, escrevesses um texto a descrevê-la, terias da minha parte um "Gosto" reservado para cada um. Os meus parabéns por mais uma bela imagem reproduzida pelas palavras que manuseias de forma tão exímia!

    Aguardo com bastante expectativa a leitura dos textos sobre a harmoniosa travessia de cruzeiro e sobre a frenética e sensual deslocação de táxi.

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    Respostas
    1. Prometo mais diários de bordo. Não conto viajar nos próximos tempos mas estes textos dão-me imenso prazer.

      Obrigada pelas sempre tão simpáticas palavras :)

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